Como avança a pandemia nos estados do Brasil?

A Rede de Pesquisa Solidária tem utilizado o nível de risco de incidência da COVID-19, conforme proposto pelo Harvard Global Health Institute (HGHI), para analisar a evolução da pandemia nos estados brasileiros. O indicador é calculado através da estimativa da  média móvel dos casos confirmados por 100 mil habitantes e classifica o risco em quatro níveis: alto, moderado-alto, moderado-baixo e baixo (ver Tabela 1). A média móvel corresponde à média do número de casos por 100 mil habitantes de 7 dias, centrada no dia em questão. Nesta nota propomos analisar o nível de risco à pandemia COVID-19 nos estados brasileiros ao longo do mês de agosto de 2020 em comparação com o mês anterior.

Para o mês de julho, a média móvel do primeiro dia é resultado das médias diárias de novos casos de COVID-19 por 100 mil habitantes dos dias 28 de junho até 4 de julho. Da mesma forma para o dia 31 de julho, a média é calculada com dados de 7 dias centrados no dia em questão (28 de julho a 3 de agosto). Já para o mês de agosto, a primeira média móvel, do dia primeiro de agosto, engloba os dados de 29 de julho até o dia 4 de agosto, assim como a última média utiliza dados do dia 28 de agosto até 3 de setembro.

Tabela 1. Níveis de Risco de COVID-19 de acordo com Incidência de Novos Casos Diários

Fonte: Adaptado do Harvard Global Health Institute (https://globalepidemics.org/key-metrics-for-covid-suppression).
Níveis de risco baseados na média dos novos casos diários por 100 mil habitantes nos últimos 7 dias.

Conforme observado na Figura 1, analisando as médias mensais de novos casos por 100 mil habitantes com os dados oficiais disponibilizados nos boletins epidemiológicos estaduais, nenhum estado brasileiro apresentou nível de risco à COVID-19 classificado como moderado-baixo ou baixo em julho e agosto. Nos dois meses analisados os estados apresentaram médias mensais de novos casos por 100 mil habitantes nos níveis mais altos, ou seja, com risco moderado-alto e alto.  .

No mês de julho, 10 estados e o Distrito Federal estavam no nível alto de risco de COVID-19, com 16 estados no nível moderado-alto. Em agosto, 9 estados e o Distrito Federal estavam o número de estados em alto nível de risco de COVID-19 (>25) e o restante em nível moderado-alto.

Figura 1. Mapa de nível de risco de COVID-19 dos estados e Distrito Federal por média mensal para os meses de julho e agosto de 2020

Fonte: Elaboração própria, com base em dados reportados pelas Secretarias Estaduais de Saúde/Consolidação por Brasil.IO (Justen et al, 2020).

Na Tabela 2 comparamos a evolução dos novos casos por 100 mil habitantes nos meses de julho e agosto em cada estado. Para analisar se houve mudança no nível de risco de COVID-19 foi usada a média mensal de novos casos por 100 mil habitantes. Em comparação com as médias mensais de julho, os estados em agosto tendem, de modo geral, apresentam uma menor taxa de novos casos por 100 mil habitantes, com exceção de 9 estados: Goiás, Minas Gerais, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Paraná, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, São Paulo e Tocantins. Nestes 9 estados houve aumento no nível de risco em agosto em comparação com julho. Tocantins foi o estado que teve o maior aumento da média mensal comparado ao mês de julho, de 28,9 para 54 novos casos de COVID por 100,000 habitantes. No caso de Goiás e Mato Grosso do Sul, que também registraram um aumento no nível de risco de COVID-19 em agosto, as médias móveis alcançaram valores superiores a 25 novos casos por 100 mil habitantes durante todo o mês. 

O Rio de Janeiro teve um aumento pequeno comparando as médias mensais, de 10,2 para 11,2 novos casos por 100 mil habitantes, retornando a apresentar aumento no registro de casos após ter apresentado queda no mês de julho. Este aumento no número de casos no estado do Rio de Janeiro também foi verificado pelo sistema InfoGripe, que registrou aumento no número total de Síndromes Respiratórias Agudas (SRAG) e no número de SRAG por COVID-19 neste estado em agosto [1].

O estado de Santa Catarina apresentou oscilação na notificação de novos casos, mais especificamente no dia 31 de agosto, apresentando 30.913 novos casos. Este número elevado de registros em um único dia dificulta avaliar se houve de fato uma redução acentuada de casos e qual seria o grau dessa redução. Com um crescente aumento no número de novos casos no mês de julho, Mato Grosso e Rio Grande do Sul se consolidaram no nível alto de risco em agosto. Minas Gerais, Paraná e São Paulo permaneceram no mesmo nível (10-25) durante julho e agosto. Além do Distrito Federal, houve 5 estados que se mantiveram em alto nível de risco nos dois meses analisados, são eles: Amapá, Mato Grosso, Piauí, Rondônia e  Roraima.

Tabela 2. Níveis de Risco de COVID-19 dos estados e Distrito Federal,  maior número dias e média de dias de permanência no nível de risco (destaque em azul ao estados que permaneceram todo o mês no mesmo nível de risco).

Fonte: Elaboração própria, com base em dados reportados pelas Secretarias Estaduais de Saúde/Consolidação por Brasil.IO (Justen et al, 2020).

A Figura 2 mostra a média móvel do número de casos por 100 mil habitantes reportados pelas secretarias de saúde de cada estado comparando os meses de julho, em azul claro, e agosto, em azul escuro, por região. Esta figura também apresenta uma linha horizontal para sinalizar em qual nível de risco se encontra o estado ao longo do mês, ou seja, vermelha para risco alto e laranja para risco moderado-alto. Não há nenhum estado da região do Nordeste entre aqueles que apresentam aumento no nível de risco no mês de agosto, enquanto todos os estados do Centro-oeste apresentaram aumento no nível de risco de COVID-19.

Figura 2- Número de casos de COVID-19 por 100 mil habitantes em julho e agosto por região.

Norte

Fonte: Elaboração própria, com base em dados reportados pelas Secretarias Estaduais de Saúde/Consolidação por Brasil.IO (Justen et al, 2020).

Nordeste

Fonte: Elaboração própria, com base em dados reportados pelas Secretarias Estaduais de Saúde/Consolidação por Brasil.IO (Justen et al, 2020).

Sudeste

Fonte: Elaboração própria, com base em dados reportados pelas Secretarias Estaduais de Saúde/Consolidação por Brasil.IO (Justen et al, 2020).

Sul

Fonte: Elaboração própria, com base em dados reportados pelas Secretarias Estaduais de Saúde/Consolidação por Brasil.IO (Justen et al, 2020).

Centro Oeste

Fonte: Elaboração própria, com base em dados reportados pelas Secretarias Estaduais de Saúde/Consolidação por Brasil.IO (Justen et al, 2020).

Vale a pena chamar atenção sobre os resultadas referentes à região do Norte, onde há os estados que apresentaram níveis muito acima do limiar do nível mais alto (25 casos por 100 mil habitantes) em agosto e já se encontravam com níveis altos em julho. Esse é o caso do estado de Roraima, por exemplo, que apresentou dias em que a média móvel ultrapassou mais de 100 novos casos por 100,000 habitantes em julho, ainda que tenha registrado média móvel por semana menor em agosto. Deste modo, o estado de Roraima ainda permanece em níveis de risco que pelo critério de HGHI podem ser considerados de alto. 

Analisando os estados que reduziram o nível de risco de COVID-19 temos vários estados do Nordeste e um caso do Sudeste: Paraíba, Sergipe,  Rio Grande do Norte e Espírito Santo. Espírito Santo, Paraíba e Sergipe passaram do nível alto para o moderado-alto, com destaque para Sergipe, que apresentou uma queda acentuada, chegando no final do mês de agosto com média móvel de menos de 10 novos casos por 100 mil hab. O Rio Grande do Norte apresentou médias mais baixas com relação a julho, com uma tendência de queda no começo do mês e estabilização a partir do meio do mês de agosto. Apesar de ter permanecido a maior parte do mês (14 dias) no nível moderado-baixo, a média de novos casos por 100 mil habitantes mensal está na categoria moderado alto (entre 10 e 25 novos casos por 100 mil habitantes). Já os estados de Sergipe e Alagoas no começo do mês apresentaram risco alto de COVID-19 e durante o mês a média de novos casos de COVID-19 foi diminuindo, passando pelo nível laranja, chegando ao nível amarelo ao final, mas mantendo as médias mensais no nível moderado alto.

Conclusão

As recomendações do Instituto de Saúde Global de Harvard não somente permitem classificar os estados de acordo com o nível de risco de COVID-19, mas também sugerem medidas de controle da pandemia que deveriam ser adotadas a partir da situação de risco alcançada. Assim, os estados que se encontram no nível verde, com a pandemia mais controlada, estariam no caminho adequado de contenção da transmissão da doença e poderiam, portanto, flexibilizar as medidas de distanciamento social, embora mantendo a testagem e o rastreamento de contatos. De modo distinto, a cor vermelha representa as situações de risco alto, em que a pandemia ainda não foi controlada. Neste caso, os estados são aconselhados a adotar políticas mais rígidas de distanciamento social para que as pessoas permaneçam em casa e a transmissão da doença se reduza. No mesmo sentido, a cor laranja foi utilizada para os estados ameaçados de aumento nos níveis de transmissão da COVID-19, com potencial para retornar ao nível de risco mais elevado. Em suma, ainda há necessidade da implantação e continuidade de medidas de monitoramento e, principalmente, controle da pandemia em todos os estados brasileiros, além do Distrito Federal.

Finalmente, cabe destacar a necessidade de haver cautela na análise dos dados do mês de agosto. Durante a elaboração deste documento foram identificadas variações no estado de Santa Catarina, o que dificultou as análises sobre o nível de risco de COVID-19 para este estado. Outros estados também devem promover correções futuras nos casos notificados, principalmente nas semanas mais recentes, ou seja, no mês de agosto. Embora as análises devam ser realizadas com cautela, mantém-se a conclusão a respeito da severidade da pandemia no Brasil como também destacado pelo sistema Info-Gripe no registro de Síndromes Respiratórias Agudas (SRAG).

Referências

JUSTEN, Álvaro et al. Brasil.io: dataset: covid19. [S. l.], 14 set. 2020. Disponível em: https://brasil.io/dataset/covid19/caso/. Acesso em: 4 set. 2020.


[1]https://portal.fiocruz.br/sites/portal.fiocruz.br/files/documentos/boletim_infogripe_se202036_sem_filtro_febre.pdf