Rede de Pesquisa Solidária busca aumentar efetividade das políticas de combate à Covid-19

Nos últimos meses, no Brasil, houve intensa mobilização em torno de ações voltadas à prevenção, diagnóstico e tratamento da Covid-19. Ao lado dessas iniciativas, surgiram também grupos dedicados a analisar as políticas que estão sendo adotadas com o objetivo de mitigar os efeitos da pandemia, como a Rede de Pesquisa Solidária – “Políticas Públicas & Sociedade”, criada por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) e do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap).

O monitoramento de políticas públicas é indispensável em qualquer circunstância para orientar a tomada de decisão. Em situações emergenciais, que requerem maior assertividade e celeridade das ações, o trabalho de acompanhamento e aferição de resultados assume ainda maior preponderância, além de servir para retroalimentar o planejamento de novas ações. No caso da Rede, a proposta é se dedicar ao levantamento criterioso de dados, para produzir informação de qualidade, criar indicadores, elaborar modelagens matemáticas, além de indicar gargalos e identificar possíveis melhorias em políticas públicas.

A Rede nasceu com caráter multidisciplinar e multi-institucional, estabeleceu interlocução com parceiros no exterior e contou com a contribuição de instituições e doadores privados. Isso viabilizou o envolvimento de inúmeros alunos de iniciação científica no projeto. “Basicamente, nosso trabalho é monitorar os impactos econômicos e sociais da crise na saúde, acompanhar as reações da sociedade às medidas adotadas e construir análises, projeções e cenários que permitam rápidas correções de rota e maior efetividade das políticas”, detalha Glauco Arbix, professor da USP e um dos coordenadores da Rede.

Ao todo, participam mais de 50 pesquisadores voluntários das áreas de humanidades, biológicas e exatas, que atuam em universidades, centros de pesquisa, empresas, hospitais ou fundações, totalizando cerca de 20 organizações parceiras. Entre elas estão as Universidades de Oxford, no Reino Unido, e de Duke e do Texas, nos Estados Unidos. Essa interlocução facilitou, por exemplo, o uso de técnicas avançadas de modelagens estatísticas, com a utilização de inteligência artificial e mineração de dados para o processamento do conjunto de informações.

A equipe está organizada em cinco eixos de análise: políticas públicas, lideranças comunitárias, mercado de trabalho, acesso a serviços de saúde e medidas adotadas para proteção social. Existe a perspectiva de incluir mais um relacionado a transportes/mobilidade.

No projeto Mercado de trabalho e renda, foram investigados os segmentos mais frágeis de trabalhadores brasileiros e o grau de vulnerabilidade na pandemia da Covid-19. De forma simplificada, os dados apontaram que mais de 80% da população “experimenta algum tipo de vulnerabilidade”. Esses trabalhadores estão dispersos em todo o país. “Isso significa que todas terão seus mercados de trabalhos afetados de forma semelhante”, com perda significativa do emprego e/ou deterioração da renda da população, alertam os pesquisadores no Boletim nº 2.

Em outra análise, associada ao eixo Monitoramento de Políticas Públicas, o foco dos pesquisadores foram as políticas para pesquisa e inovação adotadas por alguns países na busca por soluções de combate à crise. Foi observado que enquanto algumas economias foram incisivas e lançaram pacotes robustos para a contenção da pandemia, o Brasil definiu orçamento para financiar a pesquisa sobre a doença, mas não injetou recursos em quantidade elevada ou propôs uma estratégia clara de enfrentamento da pandemia. Considerando que a saída para crise está relacionada à produção de conhecimento, do qual depende a capacidade de produzir vacinas, medicamentos e todo tipo de insumos e instrumentos para combater a Covid-19, o Boletim nº 6 conclui que é necessário tanto políticas coordenadas no momento atual, quanto a construção de uma estratégia de futuro para a C&T com prioridades, embasadas em conhecimento científico e mais investimento em pesquisas sobre a doença.

Os boletins são publicados semanalmente e divulgados na mídia e em redes sociais. Uma parceria estabelecida com jornal de grande circulação tem facilitado o alcance das informações em um público maior. “Nosso maior objetivo com a Rede é contribuir para tomada de decisão e temos conseguido levar as informações a esse público. Fizemos reuniões com vereadores da capital paulista, temos tido contato com o Comitê de Contingência do governo do Estado de São Paulo, participamos de debate sobre renda e seguridade social com o presidente da Câmara dos Deputados, e estamos em contato com o Consórcio do Nordeste”, exemplificou Glauco Arbix.

O acesso a dados confiáveis é o maior desafio, pois constituem variável chave para a produção de informação e métricas sobre políticas públicas. Mas a despeito disso, Arbix entende que é possível enxergar uma mudança positiva. “A forma de se fazer ciência não será a mesma daqui em diante. A pesquisa interdisciplinar ganhou força. Vemos uma profusão de bancos de dados abertos, pois o combate à pandemia exige troca de informações de forma livre e rápida para fazer o conhecimento e a pesquisa avançarem. Open science, open research podem permanecer como tendências”, conclui Glauco Arbix.

Você pode ler o boletim InforMEI de junho na íntegra.